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Captação, compartilhamento e armazenamento de imagens em condominios sob prisma da LGPD
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Captação, compartilhamento e armazenamento de imagens em condominios sob prisma da LGPD

Escrito por: PATRÍCIA LUCONI BERTOLO

ESPECIALISTA EM DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL, REGISTRAL E NOTORIAL E EXTENSÃO EM DIREITO IMOBILIÁRIO

Este artigo a seguir estuda a legalidade da operacionalização de câmeras de monitoramento em áreas comuns condominiais adequando-se a Lei de Proteção de Dados, visando elucidar mediante a análise de cada verbo-tipo as regras para utilização destes sistemas de segurança predial.

PROTEÇÃO DE DADOS.

Poucas legislações pátrias criaram tanto burburinho quanto a lei de proteção de dados. A tão discutida legislação criada com objetivo preventivo de regular o manuseio de dados sensíveis amplamente exposto pelo avanço da tecnologia, objetiva mediante punições disciplinares prevenir demandas judiciais indenizatórias pelo uso de informações e imagens de forma não autorizada.

Em âmbito condominial, diversas esferas foram afetadas. Já se travou exaustivamente batalha jurídica sobre a coleta de dados dos condôminos, tais como nome, RG, CPF, placas de veículos, endereço, telefone, e-mail etc. e sua divulgação para terceiros ou utilização comercial dos dados.

Todavia, também é protegida pela legislação em comento as imagens efetuadas por sistema fechado de monitoramento eis que tais dados permitem a identificação do individuo.

De tal forma, ao debruçar-se sobre a captação, coleta, armazenamento e compartilhamento de imagem percebe-se que a doutrina e jurisprudência ainda mantém-se precária. Assim, faz-se necessário relembrar o termo dados pessoais e sensíveis, para podermos clarear o tema.

Dados pessoais e sensíveis: a imagem como dado sensível.

A legislação aplica-se a toda relação em que ocorre o tratamento de dados pessoais e objetiva, em apertada síntese, proteger a liberdade, a privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural (física ou jurídica), no que toca às suas informações e dados.

Segundo a referida lei, são dados pessoais toda informação relacionada a pessoal natural identificada ou identificável. Daí dizer que, a imagem captada pelas câmeras no ambiente de trabalho, a princípio, é considerada dado pessoal, justamente porque permite a identificação do titular nos termos da referida lei.

A Constituição Federal já previa a proteção a imagem ao estabelecer no artigo 5º, inciso X que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

Diante dos ditames legais, a priori não é permitido utilizar, compartilhar, divulgar a imagem de qualquer pessoa sem a sua autorização, sob pena de, dependendo das circunstâncias do caso ver-se obrigado a indenizar a vítima.

Captação de imagens por sistema de monitoramento fechado:

Que a utilização da tecnologia do sistema interno de monitoramento por câmeras trouxe grandes benefícios a coletividade mormente no que tange a identificação de infrações e seus sujeitos executantes, é notório.

Seja mediante captação de imagem em sistema de monitoramento público ou privado em shoppings centers, mercados, lojas comerciais, escolas, o monitoramento auxiliou a desvendar muitos casos, servindo inclusive como prova judicial, ainda, que sem a concordância e consentimento expresso do titular de dados.

Para Lordello[8], os benefícios proporcionados pelas câmeras de segurança são tanto na correição quanto na prevenção do dano, isto porque atua como fator psicológico de dissuasão (uma vez que o titular sabe que esta sendo vigiado e portanto é identificável) consequentemente age inibe a ação de pessoas mal-intencionadas.

Quando usada de forma correcional auxilia facilitando o trabalho de pronta resposta sendo muitas vezes integrado a outros sistemas e tecnologias que darão maior êxito na busca do ofensor e na reparação do dano.

Em que pese os benefícios narrados a utilização indiscriminada pode figurar como arbitrária e abusiva ao direito a dignidade da pessoa humana. Mormente, o sistema de monitoramento em condomínios deverá observar alguns critérios previstos pela Lei de Proteção de Dados.

Via de regra qualquer dado sensível que possuir termo de consentimento expresso do titular do dado gera a possibilidade de utilização . Não se pode olvidar que a imagem é dado personalíssimo intrasferível de forma que somente o titular do dado pode exercer com total liberalidade a autorização para sua utilização .

Como é de amplo conhecimento a LGPD- Lei Geral de Proteção de Dados teve como escopo a GPDR – Regulamento Geral de Proteção de Dados, contudo, no que tange a captação de dados sensíveis sem o consentimento do titular a legislação europeia deixa expressamente vedada a possibilidade.

Em seu art. 9º, entende que é proibido qualquer dado biométrico que torne identificável a pessoa de maneira inequívoca, exceto se vinculado a explícito consentimento para o tratamento de dados pessoais para finalidade especifica.

No entanto a legislação protetiva pátria ampara a utilização das imagens dispensando-a do expresso consentimento do titular amparada pelo art. 7º, quando embasado em alguma das seguinte hipóteses:

Cumprimento de obrigação legal ou regulatória

Uso para execução pública para execução de políticas

Por órgão de pesquisa

Para execução de contrato

No exercício regular de direitos em processos

Para proteção da vida ou incolumidade física do titulas/terceiro

Para tutela da saúde

Atender aos interesses legítimos

Proteção do crédito

Desta forma, ao se tratar de sistema interno de vigilância parece que o monitoramento em áreas comuns independe de consentimento , no que tange a captura de dados, eis que o legítimo interesse passa a ser a base legal justificadora.

A teor da lei a base legal utilizada para o processamento dos dados, ela precisa ser comunicada ao titular, ou seja, ele precisa ter o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados Europeu (“GPDR”). “Art. 9º Tratamento de categorias especiais de dados pessoais.

1º É proibido o tratamento de dados pessoais que revelem a origem racial ou étnica, as opiniões políticas, as convicções religiosas ou filosóficas, ou a filiação sindical, bem como o tratamento de dados genéticos, dados biométricos para identificar uma pessoa de forma inequívoca, dados relativos à saúde ou dados relativos à vida sexual ou orientação sexual de uma pessoa.

2º O disposto no nº 1 não se aplica se se verificar um dos seguintes casos: a) se o titular dos dados tiver dado o seu consentimento explícito para o tratamento desses dados pessoais para uma ou mais finalidades específicas, exceto se o direito da União ou de um Estado-Membro previr que a proibição a que se refere o nº 1 não pode ser anulada pelo titular dos dados; b) se o tratamento for necessário para efeitos do cumprimento de obrigações e do exercício de direitos específicos do responsável pelo tratamento ou do titular dos dados em matéria de legislação laboral, de segurança social e de proteção social, na medida em que esse tratamento seja permitido pelo direito da União ou dos Estados-Membros ou ainda por uma convenção coletiva nos termos do direito dos Estados-Membros que preveja garantias adequadas dos direitos fundamentais e dos interesses do titular dos dados; conhecimento de que seus dados estão sendo coletados e por quais motivos, razão pela qual o condomínio deve procurar meios para informar os usuários de tal informação. Placas informativas espalhadas no interior do empreendimento pode ser uma opção para o cumprimento de tal exigência.

De outro modo, a utilização de imagens para vislumbre de situações comezinhas do cotidiano da comunidade condominial não parece justificar-se, podendo ser considerada violação a intimidade privada.

Compartilhamento/divulgação em canal aberto:

O direito à intimidade e à vida privada é considerado no Direito Civil brasileiro como direitos da personalidade e, segundo a nossa Constituição Federal de 1988, art. 5º, inciso X, um direito fundamental e inviolável.

A intimidade e a vida privada são direitos que se interpenetram, guardando entre si grande vinculação. Contudo, mesmo que usualmente os conceitos se confundam, eles são distintos, guardando aspectos em que é possível uma diferenciação, destacando-se o fato de que a intimidade pertenceria a um círculo mais restrito do que o direito à vida privada.

O cerne do estudo da utilização do sistema de monitoramento por câmeras de vigilância afunila-se no compartilhamento ou divulgação das imagens real time isto porque, a prerrogativa alcançada pela lei da captação de imagem para proteção da vida ou incolumidade física do titular/terceiro dispensa o compartilhamento dos dados.

Em outras palavras a dispensabilidade de consentimento com escopo na segurança privada/legitimo interesse encontra seu fim na captação, manuseio, tratamento e armazenamento de imagens . O compartilhamento tempo real para os usuários do sistema prescinde da excludente de autorização por razão de segurança.

Melhor dizendo, em um condomínio as imagens captadas irão garantir a segurança local, eis que poderá inibir a conduta de qualquer ameaça a incolumidade física , psíquica ou patrimônio comum e individual. O armazenamento poderá auxiliar na busca a identificação do fato e a verificação de seus causadores, reparando os danos ocorridos. Todavia, o compartilhamento possui o condão de expor a vida privada dos condôminos, de forma que a sua utilização em CFTV, somente poderá ser realizada com o consentimento dos usuários do sistema. E, este é o ponto crucial deste celeuma. Uma vez que a captação do consentimento de todos os participes deste sistema se torna praticamente impossível. Veja que em um sistema condominial a exigência do consentimento formalizado não abrange somente os titulares das unidades autônomas, mas considerando ser direito personalíssimo , todos os usuários/ moradores da unidade.

Neste caso, havendo menores impúberes estes deverão ser representados pelos seus genitores, da mesma forma os titulares de dados sensíveis que estão abrangidos pelo instituto da curatela e tutela . Afora tais usuários, não se pode deixar de consignar que todos aqueles que ingressem no ambiente condominial em um sistema de “reality show” deverão consentir o compartilhamento da imagem em tempo real. Isto abrange uma gama variada de usuários sejam estes prestadores de serviços, visitantes, hóspedes de plataformas de locação/hospedagem, o que de forma prática a captura do consentimento se torna bastante dificultosa.

Frise-se, não esta tratando de captação de imagem, guarda e monitoramento mas compartilhamento em celulares, televisivos , entre outros aparelhos eletrônicos, para as unidades condominiais . De um lado, o sistema de compartilhamento de imagens em tempo real se ampara na segurança dos usuários e empreendimento, posto que o condômino não residente poderá estar sempre atento a quaisquer ocorrências em seu condomínio.

Da mesma forma, aqueles que buscam resguardar situações como ingresso de funcionários, visitantes ou mesmo dos próprios moradores (crianças retornando da escola a exemplo) defendem o “reality show” condominial . Diante de tal impasse, caberá ao condomínio mediar formas a fim de que, caso entenda necessária a manutenção do compartilhamento coletivo do sistema de monitoramento, utilize-se de ferramentas tecnológicas e estratégias jurídicas que busquem o consentimento daqueles que frequentam de forma aleatória as instalações ou as unidades autônomas.

Consoante a isso, parece a alternativa mais salutar para evitar maiores transtornos face a proteção aos direitos fundamentais de liberdade e de privacidade, o compartilhamento de imagens a terceiros, dados que deveriam, via de regra ser restritos ao operador na central de monitoramento somente quando por requerimento justificado de acordo com o art. 7 º da Lei de Proteção de Dados.

Armazenamento de imagens:

 O armazenamento destes dados pessoais (gravação das imagens) deverá ser cercado de todas as medidas técnicas e administrativas aptas a proteger os dados pessoais de acessos não autorizados e de situações acidentais ou ilícitas de destruição, perda, alteração, comunicação ou difusão. Além disso, somente poderão ser guardadas pelo tempo mínimo necessário para o estudo pretendido pela empresa, isto é, até o alcance de sua finalidade.

A instalação de softwares de verificação e proteção de vírus e invasores, firewalls e outros é medida imprescindível para a saúde do sistema com seu monitoramento e rastreio em recorrência. Por sua vez, as filmagens deverão ser descartadas após cumprimento de seu propósito. Faz-se oportuno comunicar igualmente aos condôminos o prazo para depósito e guarda das imagens referenciadas. Tanto o acesso, armazenamento e descarte dos dados deverão constar de política de privacidade, bem como deverá ser registrada a base legal sob a qual os dados serão tratados.

Alternativa para regularização do compartilhamento :

 Considerando que a legislação não especifica as medidas a serem tomadas para prevenção de violações a proteção de dados, permeia um variado leque de medidas a serem tomadas pelo condomínio. Ab initio, o estudo para minimização de riscos contempla o Relatório de Impacto a Proteção de Dados (RIPD), conforme o inciso XVII do art. 5º o qual realiza a descrição dos processos de tratamento de dados pessoais que podem gerar riscos às liberdades civis e aos direitos fundamentais, bem como medidas, salvaguardas e mecanismos de mitigação de risco.

O RIPD além de mapear as razões, modo, forma da coleta de dados, justifica-os moldando-se aos princípios como finalidade, adequação, transparência, segurança, a fim de levantar os eventuais riscos e buscar a minimização ou inibição do dano. Em sequência, a realização do legítimo Interesse Assessment é ato preventivo a fim de mensurar qual é o legítimo interesse do controlador, ou seja, para qual propósito e necessária a captura de dados sensíveis.

Cabe vislumbrar na mesma intensidade os interesses e liberdades sub judice: individuais e coletivos e, em caso de conflito entre os mesmos a eleição de solução para o impasse. Essencial, segundo os comandos legais é a informação aos titulares ampla e transparente sobre a coleta de dados, imagens, ainda que com base fundamentadora de legítimo interesse a fim de dar ciência da coleta e motivação para uso dos dados manuseados.

Após tal mapeamento, o Condomínio deve elaborar um plano de ação trazendo ao palco os partícipes da gestão de dado (operador, controlador, empresa encarregada do processamento e arquivamento) para colocar em prática a execução dos mecanismos hábeis para prevenção do dano. Neste caso, uma política de privacidade, definindo a finalidade da coleta, tratamento e compartilhamento de imagens, as medidas de segurança adotadas para proteger os dados pessoais contra vazamento ou uso ilícito são documentos importantes, devendo tais politicas serem repassadas a todos os condôminos com prazo para manifestações oportunas e em analise de conflito de interesses, levar a Assembleia para ratificação dos termos.

Após elaborado, aprovada e repassada a Politica de Privacidade recomenda ser posicionada as informações de forma objetiva em local de destaque no empreendimento. Cabe ressaltar que, se o condomínio não possui terceirizada para a gestão de recursos humanos deve, mas funcionários próprios, deve em conjunto com a administração e coletividade condominial, elaborar a politica de privacidade (parte integrante do Plano de Ação) quanto a estes sujeitos de direito, levando a conhecimento dos mesmos e registrando tal ciência em ata própria ou termo de recebimento.

Vale mencionar que, a autorização de consentimento para compartilhamento de imagens mediante aprovação em Assembleia de Condomínio, possui validade precária e relativa, uma vez que o compartilhamento em tempo real é direito personalíssimo, não cabendo ndependente de quórum qualificado decidir sobre bem personalíssimo aos demais titulares que transitem no empreendimento. No caso da locação short stay, curta temporada , onde a troca de usuários é flutuante, pode-se dispor a Convenção de Condomínio a obrigatoriedade da inserção no contrato de locação da aceitação de divulgação de imagens, devendo nominarse em tal termo o patronímico de todos hóspedes.

Reverbera-se a necessidade dos condôminos dialogarem com suas prestadoras de serviço, empresas que fazem uso de sistemas de segurança com câmeras em canal interno aberto a fim de estabelecer diretrizes, politicas internas e estratégias de monitoramento para não sofrer as sanções legais e consequentemente incidir em elevadas multas a toda coletividade.

Conclusão:

Dentre o leque de dados pessoais sensíveis que a LGPD protege a imagem e característica definidora que expõe ao domínio público nossas opções, nossas crenças, nosso agir e relacionar. De tal forma, a inserção de câmeras de monitoramento fulminando em tempo real todo e qualquer ato carece ser protegida de usos ilegítimos e arbitrários bem como exposições vexatórias.

A legislação pátria previa de forma ampla através dos norteamentos constitucionais já dispostos neste artigo, todavia, a Lei de proteção de dados veio a discriminar as possibilidades e legitimar o uso de tais dados bem como a sancionar aqueles usados de forma indevida.

Em pesquisa realizada pelo Painel LGPD nos Tribunais3, desde a entrada em vigor da Lei de Proteção de Dados até agosto de 2022, somam-se 584 decisões em nossos tribunais face ao uso indevido de dados. Os conflitos mais instaurados processualmente tratam de danos morais por pela utilização de informações pessoais e fraude nas relações de consumo.

Diante das estatísticas e cientes da elevadas sanções impostas que podem chegar até 50 milhões, a fomentação de política de privacidade de dados, divulgação aos titulares, exposição das informações de fácil acesso e estratégias tecnológicas para controle de vazamentos de dados bem como captação de consentimento para a utilização é tema urgente e impreterível para a sociedade condominial.

Referências

Senado Federal. Lei nº. 13.709/20. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/l13709.htmCâmeras de

Segurança Benefícios e Proibições. Disponível em: <http://tudosobreseguranca.com.br/portal/index.php?option=com_content&task=view&id=753&Itemid=168>. Acesso em: 30 agos. 2022

GPDR. Regulamento Geral de Proteção de Dados. Disponivel em:

https://gdprinfo.eu/pt-pt.

Acesso em: 05 agosto 2022

ALENCAR, Alcione Ferreira Gomes. Cameras de segurança e a violação ao principio da intimidade e da vida privada. Disponível: https://www.editorajc.com.br/camerasseguranca-violacao-principio-intimidade-vida-privada/ Acesso:. 21 de agost. De 2022.

Poder 360.Painel LGPD nos Tribunais.Disponível:https://www.poder360.com.br/justica/em1-ano-de-lgpd-nova-lei-ja-teve-584-decisoes-judiciais-no-brasil/ Acesso:. 30 de agos. De 2022 – A Lei de Proteção de Dados possibilita a utilização das imagens em caso de se o tratamento for necessário à declaração, ao exercício ou à defesa de um direito num processo judicial ou sempre que os tribunais atuem no exercício das suas função jurisdicional.

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